Como a sensibilidade pode influir na metodologia de construção da História?
BADARÓ, Wilson Oliveira
Um grande desafio aos historiadores é alcançar as formas mais
democráticas de retratar o ideário das sociedades passadas. A História Cultural
enfrenta a imposição-mor de seu objeto de estudo; “A sensibilidade de um outro
tempo e de um outro no tempo.”[1]
Aqui a questão não é somente quantitativa em termos de fontes, registros,
documentos e etc., mas, metodológica no tocante a compreensão do passado via
sensibilidades humanas.
O sensível vê o mundo por outro ângulo em relação à ciência, é a forma
mais simples de se compreender tudo o que há ao seu redor, transmutando e
processando informações de forma subjetiva para cada ser e exteriorizando a sua
lógica individual baseada em sua emoção. Acordando com Roland Barthes, o
sensível é exatamente o “Punctum”(o emocional) frente sempre ao “Studium”(o
racional) sendo que ambos coexistem de forma inseparável e interligada. Marcel
Proust vale-se de um dos cinco sentidos (o paladar) para rememorar o passado no
episódio de Madeleine, pois, ao lembrar-se do sabor, remete o provador à
primeira situação circunstancial que é supostamente nostálgica fazendo vir a
tona as lembranças. Ou seja, a História Cultural faz urgir a subjetividade das
sensações, uma vez que, com fatos empíricos individuais, pode-se expandir tais
características particulares (tidas a priori como intrínsecas) a um determinado
grupo no tempo e no espaço.
Foram os românticos que expuseram a questão das raízes nacionais em busca
da identidade de um povo, seu modo de ser, características próprias, enfim, as
bases dos estados nacionais porvir. No entanto, a fusão do idealismo Hegeliano
e o concreto e empírico Marxista, por exemplo, trazem a famigerada dialética, e
consigo novos diálogos e proposições. Michelet em seu afinco, busca o
equilíbrio do sensível almejado e o abstrato. É a busca por uma forma de reter
sensivelmente o real e aplicar-lhe a
posteriori às abstrações, sendo esta uma fase de evolução epistemológica
que somente foi de fato alcançada pelos Annales com Lucien Febvre e sua História
das mentalidades. Importante frisar que tal teoria fora insatisfatória e pouco
persuasiva, abrindo assim, campo para outros pesquisadores e grandes nomes de
outras ciências e da própria História. Ou seja, estudar as sensibilidades
passadas reforça o quão inconsistente é o passado, que de certa forma nós
oculta suas evidências, fazendo com que nos acostumemos com a certeza parcial e
condicionada à alegação do refutável de nossa sempre necessária, incansável e
particular hermenêutica.
Droysen e sua visão partindo das “percepções sensíveis do mundo
empírico,” expressam a natureza, a
história como frutos do ideário humano.
Ele chegou a sistematizar a História e quase a tornou uma ciência, caso
não fosse a representação do passado e sua subjetividade legada por outro
historiador (concepção positivista remanescente) em outro período, tornando o
trabalho do historiador contemporâneo uma representação do já representado. O
seu método defende a observação crítica e suas relatividades e similitudes
adjacentes, e ainda as “reversões equacionais” que visam explanar o todo da
seguinte forma; singular/totalidade > totalidade/singular expresso. Por fim
o historiador chega aos objetivos impostos pela singularidade (Droysen).
Para Dilthey, a verdadeira finalidade histórica incide em “ultrapassar a
distância temporal e cultural do passado, compreendendo este outro no tempo,” evitando
claro, a falácia da interpretação do passado com as lentes da ciência e
racionalidade do presente, ou seja, descrever a história com os devidos
resguardos. Isto significaria a probabilidade da análise da psicologia do
passado, sendo as variantes deste advento de proporções imensuráveis tanto para
o bem quanto para o mal (algo natural entre seres humanos), no entanto, sem
dúvida alguma, um espetáculo de cultura garantida e a chance de descobrir os
segredos dos atos pragmáticos do passado.
Na junção Dilthey&Droysen tivemos a confirmação do óbvio com as
máximas; “só os historiadores vêem os rastros historicizantes” e “melhor é este
olhar, quão mais culto seja o observador.” Além de todos os obstáculos para um
historiador efetuar sua contribuição, vale a pena mencionar estes outros pontos
que, implícitos, se põem sequencialmente; a questão da hermenêutica do
historiador, acesso a fontes, documentos selecionados etc., compreensão do
contexto político/histórico do redator ou autor da evidência confeccionada em
questão usada como fonte, e como organizar tais variadas gamas de opções dentro
de sua obra/tese, de forma a criar um corpo mais cristalizado, obviamente,
tendo-se a base das evidências do sensível a ser inserido, tornando este ofício
ainda mais laborioso.
Lidar com as sensibilidades e poder, de fato, chegar aos extremos de
conter ambas as pulsões segundo os preceitos filosóficos do apolíneo e do
dionisíaco na hora de redigir uma história ou várias histórias é fazer valer o
relacionar de seus contextos temporais e ainda atemporais em uma banda
histórica realmente empírica como representações históricas, elevando-as à um
patamar interessante a todos e assaz importante para a humanidade como um todo,
como o que de veridicamente deve ser, um contributo para a compreensão da
realidade em questão e para o iluminar dos vestígios desta realidade no
presente, se ele ainda estiver perceptível ou contiver correlatos.
A questão aqui, não é quantitativa mas, qualitativa. O êxtase de lograr e
sublimar para um fim histórico as sensibilidades de outrora não é e nem pode
ser mensurada, mas, consideravelmente imaginada. Por toda sua relevância, em
todos os segmentos da história e da ciência através do tempo, pode-se dizer sem
receios que este sim é um desafio mais que louvável! Vencer os limiares da
sensibilidade furtiva e coordená-la para a nossa maior percepção da
reconstrução do passado. Este é um desafio instigante e desejável...
Artigos lidos através da sugestão
do texto para complemento e suporte da síntese aqui exposta:
Bibliografia
Sandra Pesavento,
« Sensibilidades no tempo, tempo das sensibilidades », Nuevo
Mundo Mundos Nuevos [En línea], Coloquios, Puesto en línea el 04
febrero 2005, consultado el 10 diciembre 2012. URL :
http://nuevomundo.revues.org/229 ; DOI : 10.4000/nuevomundo.229
Artigos complementares impressos lidos para suporte.
MARIN, Louis. Os
poderes da Imagem. Paris, Seuil, 1989.
BARTHES, Roland. O
Quarto Claro: Nota sobre a fotografia. Paris,Gallimard, Seuil 1980.
DROYSEN, Johann Gustav. História e o método histórico. IN: Leitores
Hermenêuticos Nova York, Continuum, 1988.
[1] Sandra Pesavento,
« Sensibilidades no tempo, tempo das sensibilidades », Nuevo
Mundo Mundos Nuevos [En línea], Coloquios, Puesto en línea el 04
febrero 2005, consultado el 10 diciembre 2012. URL :
http://nuevomundo.revues.org/229 ; DOI : 10.4000/nuevomundo.229.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe o seu comentário contribuição, sugestão crítica e dúvidas. Agradecemos antecipadamente pela participação e auxílio na construção do saber que é de todos!