segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

A História, a sensibilidade e a metodologia histórica.


Como a sensibilidade pode influir na metodologia de construção da História?



BADARÓ, Wilson Oliveira



Um grande desafio aos historiadores é alcançar as formas mais democráticas de retratar o ideário das sociedades passadas. A História Cultural enfrenta a imposição-mor de seu objeto de estudo; “A sensibilidade de um outro tempo e de um outro no tempo.”[1] Aqui a questão não é somente quantitativa em termos de fontes, registros, documentos e etc., mas, metodológica no tocante a compreensão do passado via sensibilidades humanas.
O sensível vê o mundo por outro ângulo em relação à ciência, é a forma mais simples de se compreender tudo o que há ao seu redor, transmutando e processando informações de forma subjetiva para cada ser e exteriorizando a sua lógica individual baseada em sua emoção. Acordando com Roland Barthes, o sensível é exatamente o “Punctum”(o emocional) frente sempre ao “Studium”(o racional) sendo que ambos coexistem de forma inseparável e interligada. Marcel Proust vale-se de um dos cinco sentidos (o paladar) para rememorar o passado no episódio de Madeleine, pois, ao lembrar-se do sabor, remete o provador à primeira situação circunstancial que é supostamente nostálgica fazendo vir a tona as lembranças. Ou seja, a História Cultural faz urgir a subjetividade das sensações, uma vez que, com fatos empíricos individuais, pode-se expandir tais características particulares (tidas a priori como intrínsecas) a um determinado grupo no tempo e no espaço.
Foram os românticos que expuseram a questão das raízes nacionais em busca da identidade de um povo, seu modo de ser, características próprias, enfim, as bases dos estados nacionais porvir. No entanto, a fusão do idealismo Hegeliano e o concreto e empírico Marxista, por exemplo, trazem a famigerada dialética, e consigo novos diálogos e proposições. Michelet em seu afinco, busca o equilíbrio do sensível almejado e o abstrato. É a busca por uma forma de reter sensivelmente o real e aplicar-lhe a posteriori às abstrações, sendo esta uma fase de evolução epistemológica que somente foi de fato alcançada pelos Annales com Lucien Febvre e sua História das mentalidades. Importante frisar que tal teoria fora insatisfatória e pouco persuasiva, abrindo assim, campo para outros pesquisadores e grandes nomes de outras ciências e da própria História. Ou seja, estudar as sensibilidades passadas reforça o quão inconsistente é o passado, que de certa forma nós oculta suas evidências, fazendo com que nos acostumemos com a certeza parcial e condicionada à alegação do refutável de nossa sempre necessária, incansável e particular hermenêutica.
Droysen e sua visão partindo das “percepções sensíveis do mundo empírico,” expressam a natureza, a história como frutos do ideário humano.  Ele chegou a sistematizar a História e quase a tornou uma ciência, caso não fosse a representação do passado e sua subjetividade legada por outro historiador (concepção positivista remanescente) em outro período, tornando o trabalho do historiador contemporâneo uma representação do já representado. O seu método defende a observação crítica e suas relatividades e similitudes adjacentes, e ainda as “reversões equacionais” que visam explanar o todo da seguinte forma; singular/totalidade > totalidade/singular expresso. Por fim o historiador chega aos objetivos impostos pela singularidade (Droysen).
Para Dilthey, a verdadeira finalidade histórica incide em “ultrapassar a distância temporal e cultural do passado, compreendendo este outro no tempo,” evitando claro, a falácia da interpretação do passado com as lentes da ciência e racionalidade do presente, ou seja, descrever a história com os devidos resguardos. Isto significaria a probabilidade da análise da psicologia do passado, sendo as variantes deste advento de proporções imensuráveis tanto para o bem quanto para o mal (algo natural entre seres humanos), no entanto, sem dúvida alguma, um espetáculo de cultura garantida e a chance de descobrir os segredos dos atos pragmáticos do passado.
Na junção Dilthey&Droysen tivemos a confirmação do óbvio com as máximas; “só os historiadores vêem os rastros historicizantes” e “melhor é este olhar, quão mais culto seja o observador.” Além de todos os obstáculos para um historiador efetuar sua contribuição, vale a pena mencionar estes outros pontos que, implícitos, se põem sequencialmente; a questão da hermenêutica do historiador, acesso a fontes, documentos selecionados etc., compreensão do contexto político/histórico do redator ou autor da evidência confeccionada em questão usada como fonte, e como organizar tais variadas gamas de opções dentro de sua obra/tese, de forma a criar um corpo mais cristalizado, obviamente, tendo-se a base das evidências do sensível a ser inserido, tornando este ofício ainda mais laborioso.
Lidar com as sensibilidades e poder, de fato, chegar aos extremos de conter ambas as pulsões segundo os preceitos filosóficos do apolíneo e do dionisíaco na hora de redigir uma história ou várias histórias é fazer valer o relacionar de seus contextos temporais e ainda atemporais em uma banda histórica realmente empírica como representações históricas, elevando-as à um patamar interessante a todos e assaz importante para a humanidade como um todo, como o que de veridicamente deve ser, um contributo para a compreensão da realidade em questão e para o iluminar dos vestígios desta realidade no presente, se ele ainda estiver perceptível ou contiver correlatos.       
A questão aqui, não é quantitativa mas, qualitativa. O êxtase de lograr e sublimar para um fim histórico as sensibilidades de outrora não é e nem pode ser mensurada, mas, consideravelmente imaginada. Por toda sua relevância, em todos os segmentos da história e da ciência através do tempo, pode-se dizer sem receios que este sim é um desafio mais que louvável! Vencer os limiares da sensibilidade furtiva e coordená-la para a nossa maior percepção da reconstrução do passado. Este é um desafio instigante e desejável...

Artigos lidos através da sugestão do texto para complemento e suporte da síntese aqui exposta:


Bibliografia

Sandra Pesavento, « Sensibilidades no tempo, tempo das sensibilidades », Nuevo Mundo Mundos Nuevos [En línea], Coloquios, Puesto en línea el 04 febrero 2005, consultado el 10 diciembre 2012. URL : http://nuevomundo.revues.org/229 ; DOI : 10.4000/nuevomundo.229

Artigos complementares impressos lidos para suporte.

MARIN, Louis. Os poderes da Imagem. Paris, Seuil, 1989.

BARTHES, Roland. O Quarto Claro: Nota sobre a fotografia. Paris,Gallimard, Seuil 1980.

DROYSEN, Johann Gustav. História e o método histórico. IN: Leitores Hermenêuticos Nova York, Continuum, 1988.



[1] Sandra Pesavento, « Sensibilidades no tempo, tempo das sensibilidades », Nuevo Mundo Mundos Nuevos [En línea], Coloquios, Puesto en línea el 04 febrero 2005, consultado el 10 diciembre 2012. URL : http://nuevomundo.revues.org/229 ; DOI : 10.4000/nuevomundo.229.

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