terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Judaísmo, uma leitura histórica sobre a atualidade: o judaísmo no espaço pedagógico.

Como o Judaísmo é inserido no campo da diversidade do espaço pedagógico: um exemplo de aplicação das práticas e técnicas de ensino lidando com a diversidade religiosa.

BADARÓ, Wilson Oliveira, et All.

Segundo tradição bíblica, se convém começar a contar a história da formação da consciência de unidade religiosa do judaísmo a partir de fatos historicamente apresentados dentro das bíblias - judaica e  cristã - que seguem uma lógica consuetudinária de retorno às escrituras para se fundamentar a ideia de uma formação social religiosamente orientada.
            Partindo de Abraão e Moisés como principais projetores da religião no mundo antigo, o judaísmo data sua fundação entre os séculos XXII e XVIII[1]. Neste sentido, Abraão deixará as práticas politeístas e passará a seguir um único deus, que por sua vez, lhe promete uma terra e a liderança do "povo de deus", sendo este povo, dotado de predileção e proteção por parte deste mesmo e único deus[2].  Após a morte de Abraão dá-se início a uma transmissão genealógica de responsabilidades religiosas que é seguida até Jacó e seus doze filhos que teoricamente geraram as doze tribos de Judá, - das quais apenas duas foram identificadas e as outras dez estão perdidas.
            Ainda seguindo a descrição de Feltrin, os hebreus, diante das promessas divinas, "prosperaram tanto e se tornaram tão ricos e tão numerosos que assustaram o reino egípcio", o que levou a sua condição de escravizados por um largo período de tempo e a quase erradicação de sua descendência devido as perseguições e morte das crianças do sexo masculino, visando assim impedir a procriação.
            É neste contexto de dificuldades e perseguições que os hebreus terão o seu próximo líder anunciado - Moisés. Este, criado entre os egípcios, se responsabilizará pela profecia das dez pragas enviadas ao Egito por deus e também  pelo "pessach" (páscoa ou passagem) do povo hebreu pelo mar vermelho atravessando em seguida o deserto em direção à terra prometida e à liberdade da escravidão imposta pelos egípcios.
            É nestas bases bíblicas que se sustentam toda a história de fé, a priori, propostas pela religião judaica para explicar o fenômeno da fundação da religião que a partir destes pressupostos terá como verdadeiro marco fundante "as leis a serem seguidas por seu "povo eleito"[3] que irão regimentar toda a vida e conduta do povo hebreu e, em específico, no nosso caso, o povo judeu.
            Assim, segundo exposição de Feltrin é que:

os dez mandamentos, o conjunto de leis sociais e penais, as regras dos alimentos, os direitos sobre propriedades... Enfim, tudo foi transmitido por Deus a Moisés, que retransmitia cada palavra ao povo que o seguia. Era o nascimento do Judaísmo.[4]
           
Naturalmente, a própria bíblia tratará de apresentar passagens de falta de fé, insubmissão e rebeldia do "povo eleito ou povo de deus" em relação ao líder Moisés, que por sua vez, representava e transmitia a palavra de deus ao seu povo, contudo, face às demandas de Moisés em defesa de seu povo, deus fora tolerante com eles e após a morte deste líder, Moisés, os hebreus adotaram o Toráh como seu mais legítimo mandamento e exemplo de vida a se seguir. Assim sendo, temos aqui, a principal ruptura entre judaísmo e cristianismo. O judaísmo não irá reconhecer mais nenhum profeta após Moisés e ainda esperam pelo seu messias, "não se levantou mais em Israel profeta comparável a Moisés, com quem o Senhor conversava face a face." (Deut, 34, 10) enquanto que os cristãos terão o reconhecimento de toda as implicações e intervenções divinas do deus único desde Abraão, no entanto terão como messias e representante principal de deus o cristo. Por isto faremos a posteriori, através do plano de aula, uma abordagem mais incisiva do judaísmo e as realidades face as sociedades ditas cristãs através dos tempos e suas implicações sociológicas.
Proposta de atuação

Pretendemos alcançar uma compreensão e comparação dos efeitos desta ruptura nos processos históricos que se deram através dos tempos entre os judeus, as outras religiões como no caso das ditas politeístas do Egito antigo. Também, compreender como os cristãos romanos se alijaram do cristianismo puramente judaico e quais as consequências destas diferenças nas práticas religiosas para os relacionamentos sociais em seus vários níveis dentro da história da humanidade. Avaliaremos tais relações sociais como no caso dos fenômenos do criptojudaísmo, da criação/formação dos grupos de cristãos-novos, da escravização pelos egípcios, do holocausto e como estes fatos históricos influenciaram dialeticamente nas transformações das práticas religiosas e sociais dos povos envolvidos nestas tramas históricas. Tais abordagens se justificam para se dar uma ideia de como as dimensões das análises históricas estão ligadas as nossas atualidades e como tais estudos se fazem pertinentes hoje para uma melhor compreensão de problemáticas de nosso contexto.
Sendo assim, fica evidente que o principal propósito desta abordagem é dimensionar o quão relevante é o conhecimento da grande gama de opções de escolha religiosa e suas condicionantes, e como esta opção influi na vida de quem escolhe, deixando claro que tal escolha não implica, necessariamente, em uma escolha de caráter irrevogável. Frisamos ainda que tal abordagem religiosa da história pretende apresentar as razões que levaram as sociedades, através dos tempos, a entrarem em conflito por questões que são muito particulares de cada cultura e que acabam por tomar proporções ideológicas no campo político, gerando, por consequência, atritos culturais.
O foco de demonstração histórica da diversidade religiosa tende, sobretudo, a enfatizar a multiplicidade e heterogeneidade das cosmovisões, em todo lugar que se vá, acerca do que é ou não religião, e como o processo legitimador destas religiões ocorrem e se firmam em diferentes sociedades. Sendo que a relatividade dos fatores legitimadores que variarão de cultura para cultura, farão o papel de elementos geradores de reflexão por parte dos alunos, que por sua vez, deverão ver ideia da necessidade de se perceber o alcance da respeitabilidade religiosa e da tolerância cada vez mais tangível a medida que nos aprofundarmos na questões da diversidade em relação a sua cultura e fundamentação religiosa.
Um exemplo mais claro de como é que trabalharemos o nosso tema gerador de discussões pode ser extraído de uma passagem de José Mattoso:

O grupo de judeus, ou parte mais visível dele, não era antes estimado. Com a conversão muito mais grave isso se tornou, na medida em que agora cristãos (novos) deixaram de estar legalmente protegidos. A conversão violenta não tem o efeito de mudar de imediato a crença do povo eleito. Pior. Não poucos desde logo se mostraram dispostos a misturar-se na sociedade, abandonando as antigas judiarias. E encetam um percurso que os pode levar à nobreza, às ordens militares, à universidade, às prebendas eclesiásticas, aos governos municipais (Tavares, 1987, pp. 49-50). Em especial será na universidade e nos cabidos que se instalarão bastantes filhos e netos de conversos.[5]

Mostrando nesta passagem que, a prática da intolerância religiosa sempre esteve presente nas sociedades mas, que por traz dela sempre esteve presente também os jogos de interesses políticos e que após o fato supramencionado, as práticas criptojudáicas se fundam e tomam corpo, sendo as ações religiosas impostas, tomadas como verdadeiramente as realizadas por estes judeus afetados por tais imposições em seu contexto histórico, contudo, as que de fato existiam e eram, sobretudo, válidas para os mesmos, era o judaísmo que, agora velado, passa a ser visto, ao menos pelas análises históricas, como veladas do corpo social coercitivo.
Aqui, a prática do Ensino de História visa fundamentar a historicidade da religião judaica e relacioná-la com um mundo mais amplo, que transcende a vida de seu seguidor, mas que ao contrário, se relaciona primariamente com o mundo ao seu redor e como por consequência dialoga com o seu fiel, trazendo-lhe assim, uma compreensão mais abrangente do papel da religião como reguladora social e individual no plano das ações políticas.
Fomentar a religião como parte constitutiva da formação humana, como parte elementar da compreensão das relações sociais dentro da história é, além de tudo, orientar os olhares para uma necessidade de estar envolvido com as discussões mais críticas acerca de sua participação social como membro de sua sociedade e não apenas como membro, mas, como agente transformador de sua realidade política, econômica e cultural. Esta afirmativa está em acordo com o que disse George Steiner ao se referir ao uso da bíblia e suas diversas interpretações através do globo:

(...) entre as pessoas não letradas ou pré-letradas, que a referência bíblica funcionava como auto-referência, como passaporte para a viagem interior em direção ao nosso âmago. As escrituras foram (e para muitos ainda são) uma presença atuante tanto no que é universal quanto no singular[6]; são culturalmente compartilhadas e, no mesmo tempo, da mais extrema privacidade. Não há outro livro como este (...) 

Sabendo a história do valor cultural, educacional e político que contém os livros sagrados como o corão, a bíblia, a torá, e tantos outros existentes e não existentes que apenas nos chegam as transmissões orais como as religiões de matriz africana. Vale aos professores de história como nós, utilizarmos sabiamente tal conteúdo em nosso proveito, cuidando sempre de aplicar no ato da prática didática no espaço pedagógico, o que tanto pregamos e prezamos – o respeito à diversidade e à diferença humanas.


Bibliografia

MATTOSO, José. História de Portugal. (Direcção) Vol. 3. Lisboa: Editorial Estampa, 1997.
STEINER, George.  Nenhuma paixão desperdiçada. Rio de Janeiro. Record, 2001.
FELTRIN, Ricardo. Conheça um pouco da história do judaísmo. Folha Online. Disponível em: < http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/2001-religiao-judaismo.shtml > Acesso em: 06/05/2012.
AVIGDOR, Renée. Judeus, sinagogas e rabinos: O judaísmo em São Paulo em mudança. Tese (Doutorado em Sociologia) São Paulo, Universidade de São Paulo, 2010.



[1] As fontes são imprecisas quanto a datação do surgimento embrionário da religião, contudo, elas convergem e apontam na direção dos fundadores primários da fé judaica - Abraão e Moisés.
[2] FELTRIN, Ricardo. Conheça um pouco da história do judaísmo. Folha Online. Disponível em: < http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/2001-religiao-judaismo.shtml > Acesso em: 06/05/2012
[3] FELTRIN, Ricardo. Conheça um pouco da história do judaísmo. Folha Online. Disponível em: < http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/2001-religiao-judaismo.shtml > Acesso em: 06/05/2012
[4] Id. Ibid.
[5] MATTOSO, José. História de Portugal. (Direcção) Vol. 3. Lisboa: Editorial Estampa, 1997. pp. 404.
[6] Grifo nosso.

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